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15 de mai. de 2016

Santo Tomás de Aquino



Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Primeiros anos

Tomás de Aquino que foi chamado o mais sábio dos santos e o mais santo dos sábios. Nasceu em março de 1225 no castelo de Roca-Sica, perto da cidade de Aquino, no reino de Nápoles, na Itália. Com apenas cinco anos seu pai, conde de Landulfo d’Aquino, o internou no mosteiro de Monte Cassino. Aí iria ser educado pelos sábios monges beneditinos, ordem religiosa fundada por Bento de Núrsia exatamente naquele local.

Tomás fez com raro brilhantismo os primeiros estudos. Mais tarde freqüentou a Universidade de Nápoles. Conheceu então os frades dominicanos, seguidores de Domingos de Gusmão, fundador da ordem dita dos pregadores. Tinha dezoito anos e resolveu fazer-se dominicano. Seus pais e irmãos ficaram decepcionados, pois Tomás era genial e tinha uma carreira fulgurante pela frente. Não queriam que ele fosse um frade de uma ordem mendicante.

Como a família o importunasse no Convento de Nápoles, Tomás foi transferido para Paris. À força foi de lá retirado e trazido de volta ao castelo paterno. Tudo fizeram para lhe tirar da cabeça a idéia de ser padre. Nada o convencia: nem rogos, nem promessas de uma existência com tudo que uma família rica pode oferecer.

A tentação e a vitória

Seus irmãos imaginaram armar-lhe uma cilada. Foi um plano realmente diabólico. Introduziram no seu quarto uma mulher bonita, charmosa, jovem, mas sem moral.

Pensaram eles que Tomás não resistiria. Entregar-se-ia a ela. Desistiria de sua vocação eclesiástica. A provocação era de baixo nível. Grande a tentação. Ao entrar a moça no quarto, Tomás compreendeu que deveria agir sem demora. O perigo era iminente. Então ele que estava entregue a uma piedosa leitura, imediatamente se levantou. Arrancou um tição da lareira. Com ele na mão, como uma espada de fogo, pôs a mulher em fuga.

A moça gritou e sumiu. Deve ter pensado que estava a lidar com um louco furioso agitando chamas, ameaçando, na aparência, deitar fogo à casa. Tomás, logo que ela saiu foi correndo até à porta, a fechou e a trancou. Num impulso natural esmurrou o tição incandescente na porta e traçou nela com o carvão um grande sinal da cruz. Jogou o que sobrou do carvão no fogo. Sentou-se de novo na sua cadeira e voltou a estudar.

Após dois anos, sua mãe Teodora concordou em libertá-lo. Deixou-se seguir para o convento de Nápoles em 1245. Acompanhado pelo Superior Geral, João o Teotônico, Tomás partiu para Paris. Dali foi para Colônia na Alemanha. Foi discípulo de Santo Alberto Magno com o qual logo se afinou culturalmente. Os estudantes de Colônia eram ávidos de discussões filosóficas. Nelas Tomás tomava parte ativamente.

Grande o proveito que tirou das sábias preleções de filosofia e teologia de Alberto Magno, cujos conhecimentos eram enciclopédicos. Com ele Tomás aprendeu que a verdadeira vida de um ser racional é fazer de sua inteligência uma ascensão contínua até chegar aos mais altos conhecimentos inteligíveis, atingindo a ciência da alma e a ciência de Deus. Ótimo discípulo, Tomás se distinguiu entre os colegas, obtendo fama pelo seu talento indiscutível.

O Boi Mudo da Cicília



Tomás fora dos momentos de debates acadêmicos e das conversações atinentes a assuntos sérios, era calado, reservado. Além disto não apreciava perder tempo com conversas inúteis. Por isto um de seus colegas o chamou de “o boi mudo”.

Este companheiro, certo dia, levou a Alberto Magno uns apontamentos de Tomás. Foi nesta ocasião que Alberto proferiu a frase que se tornou célebre, pois era uma profecia que se realizou: “Chamais Tomás de “o boi mudo”, mas vos asseguro que seus mugidos ouvir-se-ão por toda a terra”. De fato, até hoje são inúmeros os seguidores de Tomás de Aquino, chamados tomistas.

Muito provavelmente foi porque deram a ele o apelido de “o boi mudo” que um dia os frades resolveram brincar com Tomás. Este estava, como sempre, andando no claustro, ou seja, no pátio interior do convento, meditando sobre profundos assuntos referentes a Deus.

Alguém o chamou, dizendo: “Vem ver um boi voando”! Tomás, imediatamente, o acompanhou e se pôs a olhar para o alto ao som das gostosas gargalhadas de seus confrades. Estes então lhe perguntaram como, sendo tão inteligente, ele podia pensar que um boi estivesse voando. A resposta de Tomás foi uma lição maravilhosa: “Olhei porque deve ser mais fácil um boi voar do que um frade mentir”. Nunca mais brincaram com ele, respeitando seus instantes de funda reflexão.

Seus Famosos Escritos




Em 1252 Tomás em Paris ensinava como bacharel. Segundo o método da época, deste modo poderia alcançar o título de mestre e doutor. Escreveu neste período comentários ao livro de Sentenças de Pedro Lombardo, obra composta entre 1150 e 1152. Comentou também o Profeta Isaías e o Evangelho de São Mateus.

Passados quatro anos era doutor e escrevia a Suma contra os Gentios, na qual faz uma exposição da crença cristã para uso dos missionários. São quatro livros dos quais os três primeiros tratam de verdades acessíveis à razão e o quarto livro das verdades de fé propriamente ditas.

Em 1268 iniciou a Suma Teológica, sua principal produção. Consta ela de três partes, subdivididas em questões e artigos. As duas primeiras partes datam dos anos de 1266 a 1272. A terceira, iniciada em 1272, ficou incompleta. Foi complementada pelo companheiro e amigo fiel de Tomás, Reginaldo de Piperno. Esta parte se chama

Suplemento.

Além destes trabalhos citados, Tomás escreveu inúmerasQuestões como sobre a Verdade, a Alma, o Mal, a Beatitude e vários Opúsculos Filosóficos sobre assuntos diversos comoO Ente a Essência, Sobre as Falácias. Deixou ainda comentários a respeito das obras de Aristóteles e outros escritos filosófico-sociais.

Morte imprevista

Quando Tomás de Aquino tinha cinqüenta e três anos, a 7 de março de 1274, foi surpreendido pela morte no mosteiro cisterciense de Fossanova. Estava a caminho de Lião onde, por ordem do Papa Gregório X, iria participar do Concílio de Lião. Ainda no leito de morte encontrou forças para falar aos monges sobre o livro da Bíblia denominado Cântico dos Cânticos.
Após seu falecimento ele entrou para a História com o título de Doutor Angélico, dada a culminância espiritual que atingiu e a perfeição de sua existência.

Conta-se que certa ocasião, diante de um Crucifixo, Tomás ouviu de Jesus estas palavras: “Bem escrevestes sobre mim, Tomás, que prêmio quereis”? Respondeu ele: “Nada senão a Ti mesmo, Senhor”. Prestes a morrer pronunciou estas palavras, após receber a Eucaristia: “De ti, Senhor, me veio o preço da redenção da minha alma! Todos os meus estudos, vigílias e trabalhos foram por teu amor”.

Conta-se que naquele dia 7 de março de 1274 Alberto Magno que se achava em Colônia, na Alemanha, com lágrimas nos olhos comunicou aos frades: “O irmão Tomás de Aquino, meu filho em Cristo, luz da Igreja, morreu. Deus acaba de me revelar isto”. Teve, portanto, a longa distância a percepção do falecimento de seu discípulo exemplar.

O corpo de Tomás de Aquino repousa na Catedral de Tolosa, na França. Foi declarado Santo pelo Papa João XXII que o canonizou em 1323. Paulo V em 1567 o declarou Doutor da Igreja e Leão XIII o proclamou em 1879 padroeiro de todas as escolas católicas. Venera-se sua memória a 28 de janeiro, dia em que seu corpo foi transladado para Tolosa, em 1369.

Ensinamentos de Tomás de Aquino



Tomás de Aquino acentuou a diferença entre a Filosofia, que estuda todas as coisas pelas últimas causas através da luz da razão, e a Teologia, ciência de Deus à luz da revelação.
Mostrou que o homem é o ponto de convergência de toda a criação e que nele se encerram, de certo modo, todas as coisas.

Ensinou que há uma união substancial entre a alma e o corpo. Isto é o fundamento maior da dignidade da pessoa humana. Esta é um corpo que está enformado por uma alma ou uma alma a enformar um corpo.

Defendeu o livre arbítrio, ou seja, a liberdade da vontade humana para aderir ao bem ou ao mal, donde a responsabilidade moral do homem. Daí a sanção da lei: prêmio para as boas ações e punição para os atos maus.

Para ele a morte determina para sempre a alma humana quer na desordem e na infelicidade, quer na ordem e na felicidade, como está na Bíblia.

O conhecimento, ensinava Tomás, tem a primazia sobre a ação, pois nada pode ser amado se não for conhecido primeiro.

São Tomás de Aquino vencendo os herejes

Os cinco caminhos

Por cinco vias Tomás prova magistralmente a existência de Deus.
Com notável clareza expôs ele a prova tirada do movimento, partindo do pressuposto de que “tudo o que se move é movido por outro”.

Raciocina então: “se aquilo pelo qual é movido por sua vez se move, é preciso que também ele seja movido por outra coisa e esta por outra. Mas não é possível continuar ao infinito; do contrário, não haveria primeiro motor e nem mesmo os outros motores moveriam como, por exemplo, o bastão não move se não é movido pela mão.

Portanto, é preciso chegar a um primeiro motor que não seja movido por nenhum outro, e por este todos entendem Deus”1.

A segunda via é a da causa primeira universal. Eis o texto de Tomás de Aquino na Suma Teológica: “Constatamos no mundo sensível a existência de causas eficientes. É, entretanto, impossível que uma coisa seja sua própria causa eficiente, porque, se assim fosse, esta coisa existiria antes de existir, o que não tem nenhum sentido.

Ora, não é possível proceder até o infinito na série de causas eficientes, porque, em qualquer série de causas ordenadas, a primeira é causa intermediária e esta é causa da última, quer haja uma ou várias causas intermediárias.

Com efeito, se suprimirdes a causa, fareis desaparecer o efeito: portanto, se não há causa primeira, não haverá nem última, nem intermediária. Ora, se fosse regredir até o infinito dentro da série de causas eficientes, não haveria causa primeira, e, assim, não haveria também nem efeito, nem causas intermediárias, o que é evidentemente falso. Portanto, é preciso, por necessidade, colocar uma causa primeira que todo o mundo chama Deus”2.

Por este texto se percebe a clareza com que Tomás de Aquino expõe o seu raciocínio. Com rara habilidade intelectual ele procura o motivo da existência da causalidade no mundo. Assim se chega infalivelmente a uma causa que produz e não é produzida, ou seja, a causa eficiente primeira que é Deus.

Em terceiro lugar vem a prova da contingência. Em sentido amplo, contingência significa a possibilidade de um objeto qualquer de não ser, de não existir.

É tudo aquilo que pode ser como não ser. É contingente o fato de cada um de nós existirmos. Poderíamos não ter existido. A contingência metafísica significa que contingente é todo ente ao qual a existência não é essencialmente necessária.

Eis como Josef de Vries resume esta prova da existência de Deus proposta por Tomás de Aquino: “a prova cosmológica, baseando-se no nascimento e desaparecimento das coisas, conclui a contingência das mesmas, e partindo da mutabilidade própria também dos elementos constitutivos fundamentais cuja origem não pode ser mostrada experimentalmente, infere sua natureza também contingente, provando dessa maneira que o mundo todo é causado por um Ser Supramundano”3.

Este é o Ser Necessário que existe por sua própria natureza e não pode nunca deixar de existir. As criaturas nascem, crescem e morrem, são possíveis, não necessárias, ou seja, existem, mas não necessariamente. Se em algum tempo não tivesse havido nada de existente, teria sido impossível para qualquer coisa começar a existir, e, deste modo, também neste caso nada existiria o que seria um absurdo. Existe, portanto, um Ser Necessário que é Deus.

A quarta via para provar a existência do Ser Supremo é tirada dos graus dos seres. Na Suma Teológica assim se expressa Tomás de Aquino:

“Verificamos que alguns seres são mais ou menos verdadeiros, mais ou menos bons, etc. ora, diz-se o mais e o menos de coisas diversas segundo a sua aproximação diferente de um máximo. Existe, pois, alguma coisa que é o mais verdadeiro, o melhor, por conseguinte, o mais ser. Ora, o que é o máximo num gênero é a causa de tudo que pertence a este gênero. Existe, portanto, um ser que é para todos os outros causa de ser, de bondade, de perfeição total, e este ser é Deus:”4.

Deus possui o ser de modo absoluto, ao passo que as criaturas têm um grau diverso de ser. Isso significa que tal fato não lhes deriva em virtude de suas respectivas essências, caso em que seriam sumamente perfeitos e não em determinados graus. Ora, se não deriva de suas respectivas essências, isso, é lógico, significa que o receberam de um ser que concede tudo sem receber, que permite a participação sem ser ao mesmo tempo partícipe.

Este ser é a fonte de tudo aquilo que existe de algum modo. Ele é a perfeição infinita, absoluta. É um ser perfeito sob todos os aspectos que se possam imaginar. Nele se realizam com perfeição suprema todas as possibilidades do ser.

O quinto caminho apontado por Tomás de Aquino como prova da existência de Deus é o do finalismo, ou seja, do governo do mundo.

Jolivet resume esta quinta via deste modo: “No conjunto das coisas naturais verificamos uma ordem regular e estável. Ora, toda ordem exige uma causa inteligente, que adapta os meios aos fins e os elementos ao bem do todo. Portanto, a ordem do mundo é obra de uma Inteligência ordenadora, transcendente a todo o universo”5. Esse Ordenador é Deus.

De fato, quando se analisa o que ocorre no mundo se verifica que tudo age e opera como se tendesse a um fim. Não se trata de uma idéia mecanicista do universo, como se Deus interviesse juntando partes como acontece com o relojoeiro para constituir um relógio. Trata-se de se perceber a finalidade inata em algumas coisas, coisas que mostram em si mesmas um princípio de finalidade e total unidade. As exceções que se podem atribuir ao acaso não invalidam este raciocínio.

O que se busca é a causa da regularidade, da ordem e da finalidade visíveis em alguns seres. Esta causa não pode ser identificada com os próprios seres em si. É preciso, pois, remontar a um Ordenador que esteja em condições de dar ser aos seres e, na verdade, daquele modo específico no qual de fato eles operam.

As leis segundo Tomás

Segundo Tomás de Aquino, por ser racional, o homem conhece a lei natural, ou seja, está plenamente capacitado para saber que “se deve fazer o bem e evitar o mal”. Trata-se da participação da lei eterna pelo homem dotado de inteligência. A lei eterna outra coisa não é senão o plano racional de Deus, isto é, a ordem existente no universo todo. Por esta lei dirige tudo para o seu fim específico.
Além desta lei eterna e da lei natural, Tomás fala da lei humana, ou seja, jurídica. São normas feitas pelos homens para impedir que se pratique o mal. É a ordem promulgada por quem tem a responsabilidade pela comunidade.

Seguindo Aristóteles, Tomás de Aquino considera o Estado como uma necessidade natural. É que o homem é um ser social e precisa de orientações para viver em sociedade. Entretanto, Tomás de Aquino deixa claro que as leis humanas não podem contradizer a lei natural.
Aliás, no pensamento dele as normas do direito positivo existem para que os que são propensos aos vícios e neles se obstinam sejam persuadidos, a bem da ordem pública, a evitar tais desvios. Insiste Tomás na função pedagógica das leis humanas e nas sanções que podem e devem incluir. O objetivo é a convivência pacífica entre os homens.

Tomás de Aquino e a Filosofia Grega

Tomás de Aquino repensou Aristóteles, o grande filósofo grego do século V antes de Cristo. Deu diretrizes novas ao pensamento de Platão, outro grande filósofo daquele século. Deus é para Tomás o Criador de tudo, noção não atingida pela filosofia grega. O dualismo inexplicável entre o mundo ideal e o mundo fenomenal, entre Deus e a matéria foi inteiramente superado por Tomás de Aquino.

A ética de Aristóteles é sem obrigação e sem sanção, mas não assim a moral exposta pelo Aquinate.
Na lógica, parte da filosofia que trata da lei do raciocínio correto, Tomás de Aquino expôs e comentou os ensinamentos de Aristóteles, dado que a lógica aristotélica é perfeita. O filósofo grego foi o pioneiro que investigou cientificamente as leis do pensamento e as formulou com exatidão. Kant, filósofo alemão, afirmou que os filósofos posteriores nada acrescentaram ao que Aristóteles ensinou neste aspecto da filosofia6.

Entretanto, a teodicéia de Aristóteles, ou seja, a parte que trata de Deus, é incomparavelmente inferior à de Tomás de Aquino.

Como Aristóteles, porém, Tomás de Aquino na política, acertadamente, ensina que a bondade de um governo, sua eficiência, não dependem de sua forma, mas da honestidade, da competência com que se dedica ao bem comum, ao bem estar dos cidadãos.

Seja monarquia, república ou outra forma qualquer, melhor será, concretamente, a que mais se ajustar às necessidades do povo.

Leão XIII e Tomás de Aquino

Leão XIII que foi considerado o papa dos operários escreveu uma encíclica7, isto é, uma carta circular, solene, sobre a filosofia, em 1879. Neste documento a figura de Tomás de Aquino é objeto de especiais considerações.

Diz o texto que Tomás de Aquino foi quem com maior perfeição uniu a inteligência, a razão, à fé. Fala na excelência e perfeição da doutrina tomista. A confirmação desta importância é atestada pelo valor em si do que ele ensinou, pelos aplausos das Academias e Escolas e até pelos que não são católicos.

Odilon Moura deste modo resumiu o plano da referida encíclica: “Há necessidade de se instaurar uma Filosofia que harmonize a razão com a fé, para implantação da ordem na sociedade (números 1-20); ora, a Filosofia de Tomás é a que melhor atende aos requisitos para a harmonia entre a razão e a fé (números 21-27); logo, deve ser instaurada a Filosofia de Santo Tomás (números 28-37)”8.

Um dos trechos mais expressivos da referida encíclica é este: “Entre todos os doutores escolásticos, brilha como astro fulgurante, e como príncipe e mestre de todos Tomás de Aquino, o qual, como observa o Cardeal Caetano, “por ter venerado profundamente os santos doutores que o precederam, herdou, de certo modo, a inteligência de todos”. O termo escolástica empregado acima significa filosofia ensinada nas escolas medievais do Ocidente Europeu.

Diz ainda Leão XIII: “Tomás reuniu suas doutrinas, como membros dispersos de um mesmo corpo; reuniu-as, classificou-as com admirável ordem, e de tal modo as enriqueceu, que tem sido considerado, com razão, como o próprio defensor e a honra da Igreja”.

Este trecho a seguir retrata admiravelmente quem foi Tomás de Aquino: “De espírito dócil e penetrante, de fácil e segura memória, de perfeita pureza de costumes, levado unicamente pelo amor da verdade, cheio de ciência divina e humana, justamente comparado com o sol, aqueceu a terra com a irradiação de suas virtudes e encheu-a com o resplendor de sua doutrina”.

Sobre seu espírito filosófico Leão XIII atesta: “Não há ponto da filosofia que não tratasse com tanta penetração como solidez. As leis do raciocínio, Deus e as substâncias incorpóreas, o homem e as outras criaturas sensíveis, os atos humanos e seus princípios, são objeto das teses que defende, nas quais nada falta, nem a abundante colheita de investigações nem a harmoniosa coordenação das partes, nem o excelente método de proceder, nem a solidez dos princípios”.

Quem se interessa por obter outras análises de Leão XIII sobre Tomás de Aquino encontra nesta encíclica inúmeras outras considerações que mostram o valor deste filósofo extraordinário.
Tomás de Aquino hoje

Os discípulos, os seguidores de Tomás de Aquino neste final do século XX são incontáveis.
Filósofos talentosos das mais diversas nações encontram em Tomás de Aquino elementos valiosos para suas pesquisas. Sertillanges, Maritain, Gilson, Garrigou-Lagrange, De Finance, Caturelli são alguns entre muitos que manifestam a presença vigorosa do tomismo em nossos dias.

No Brasil Fernando Arruda Câmara, notável filósofo brasileiro, lançou o livro “Tomismo Hoje”, no qual mostra o grande número de tomistas em nossa pátria, entre os quais, se destaquem Maurílio Teixeira Leite Penido, Leonardo Van Acker, Henrique Cláudio de Lima Vaz, Alexandre Correia.
A reelaboração do tomismo efetuada pelos filósofos de nossos dias tem como característica um estudo direto dos textos de Tomás de Aquino. Além disto se nota uma fidelidade absoluta às teses fundamentais estabelecidas por ele. Percebe-se diálogo aberto com as outras correntes filosóficas atuais. Há ainda uma preocupação dos tomistas de hoje de investigar em profundidade a cultura moderna, contemporânea.

Tais discípulos de Tomás de Aquino são chamados neotomistas que tentam responder às profundas perguntas que se colocam ao homem de hoje, cristãos ou não-cristãos. Há sobretudo um apelo à Verdade e ao Amor Criador que precisam penetrar no íntimo da realidade humana.

À cultura moderna e contemporânea influenciada pela técnica e pela ciência, endeusadas erroneamente, o tomismo traz uma contribuição admirável. Leva o ser racional ao encontro de Deus e dos valores perenes, sem os quais é impossível a verdadeira felicidade. Trata-se de libertar o homem da escravidão do materialismo com todas as suas terríveis conseqüências.

Chesterton, pensador inglês afirmou: “Neste momento atual, tão pouco esperançoso, não há homens tão esperançosos como aqueles que consideram agora Santo Tomás como guia em uma centena de perguntas angustiosas respeitante às artes, à propriedade e à ética econômica. Há inegavelmente um tomismo esperançoso e criador em nossa época”9.

É também deste autor esta frase luminosa: “Que o tomismo seja a filosofia do bom senso, o mesmo bom senso o proclama”10. O erro seria considerar o tomista como quem entende Tomás de Aquino de modo estático, medieval. Nada disto. Através de um estudo maduro, de uma reflexão atenta, o tomista procura pinçar o que está latente nos escritos de Tomás de Aquino.

Como observou Dino Staffa: “Nenhuma das maravilhosas conquistas da ciência física são inconciliáveis com a doutrina tomista, senão que a integram e iluminam”11.

Há, de fato, uma perfeita harmonia entre os ensinamentos de Tomás de Aquino e as descobertas científicas de hoje.

Jean Ladrière recentemente declarou: “A atualidade do pensamento de Santo Tomás de Aquino é a presença contínua de uma força inspiradora capaz de assumir, em suas figuras cambiantes, o destino da razão, a consciência que ela tomou de suas conquistas como de seus limites, o pressentimento que ela traz consigo daquilo que lhe pode dar absolutamente seu sentido”12.

Wolfgang Kluxen situou, com rara felicidade, a posição do tomismo ao escrever que este “não é a última palavra da razão e isto segundo seus próprios princípios. Basta, porém, que seja uma palavra real, séria, verdadeira; e, como tal, ele permanecerá sempre atual, contemporâneo a todas as épocas”13.

O reencontro da juventude de hoje com Tomás de Aquino significa libertação e renovação cultural forte. Tomás de Aquino é um convite ao afastamento de tudo que degrada o ser humano. Ele inspira segurança para que se ande nos caminhos do bem e dos verdadeiros valores. Enche de esperança o coração juvenil.

João Paulo II e Tomás de Aquino

Realizou-se em Roma em 1990 o nono Congresso Tomista Internacional. João Paulo II, o atual papa, recebeu em audiência os participantes deste Congresso promovido pela Pontifícia Academia de Santo Tomás. Na oportunidade falando aos tomistas ali reunidos o papa recordou que em 1880 havia chamado Tomás de Aquino de “Doutor da Humanidade”. Tal título era baseado no muito que Tomás de Aquino escreveu dignificando a natureza humana com suas colocações filosóficas e teológicas.
Lembrou o papa os ensinamentos do Aquinate nas obras “Sobre Homem” e “Sobre Deus Criador” nas quais ele ensina que “enquanto o homem é obra das mãos de Deus, traz em si a imagem de Deus e tende, por natureza, a uma semelhança com Deus cada vez mais plena”14.

Depois de outras profundas considerações João Paulo II assim se expressou: “Deve-se, portanto, desejar e favorecer de todos os modos o estudo constante e aprofundado da doutrina filosófica, ética e política que Santo Tomás deixou em herança às escolas católicas e que a Igreja não hesitou em fazer própria, de modo especial no que diz respeito à capacidade, à perfectibilidade, à vocação, à responsabilidade do homem quer na esfera pessoal quer na social…”

Quanto à atualidade da doutrina tomista assim se expressou o papa: “Santo Tomás não podia certamente prever um mundo cultural e religioso tão vasto e complexo e articulado como nós hoje conhecemos. Nem podia, portanto, ditar soluções concretas para a grande quantidade de problemas específicos que nós hoje devemos enfrentar”.

Prossegue, porém, o papa: “Mas dado que seu maior cuidado foi colocar-se e manter-se da parte da verdade universal, objetiva e transcendente […] traçou um método de trabalho missionário que é hoje substancialmente válido também no plano das relações ecumênicas e inter-religiosas, assim como no confronto com todas as culturas antigas e novas”.

Portanto, a doutrina de Tomás de Aquino é apta para a aproximação dos cristãos entre si e para o entendimento das culturas passadas e recentes.

De fato, o amor à verdade que fulgiu, brilhou, em Tomás de Aquino conduz à sociabilidade é à solidariedade, à liberdade que, segundo João Paulo II, firmado no Aquinate, não pode ser real se não está fundamentada nesta verdade. A crise moral do mundo de hoje lembra no seu discurso o papa “depende do enfraquecimento do sentido da verdade nas inteligências e nas consciências, que perderam a referência à fundação última da verdade mesma”.
É aí, precisamente, que se deve ver a importância capital do contacto com a doutrina de Tomás de Aquino.

Tomás de Aquino e Francisco de Assis

Dada a popularidade de Francisco de Assis, melhor se pode ter uma idéia de Tomás de Aquino, fazendo-se uma comparação entre ambos.

Francisco de Assis era magro, de baixa estatura, vibrante, um corisco. Vivia atrás de seus pobres. Era um andarilho de Deus. Caminhava pelas estradas para ajudar os necessitados. Andava modestamente pelas ruas edificando a todos. Tomás de Aquino era corpulento, pesado como um touro. Gordo, vagaroso. Tranqüilo e quieto. Nada sociável, era tímido. Vivia meditando, refletindo.
Francisco de Assis era irrequieto e para muitos um tanto quanto maluco em suas privações. Tomás de 

Aquino era o Homem da Pontualidade, da Regra, do Método.

Francisco de Assis desprezou os estudos e nem queria que seus seguidores freqüentassem as universidades. Tomás de Aquino era o intelectual debruçado sobre os livros e sempre a escrever.

Francisco de Assis era um poeta ambulante, imerso na beleza das flores, do murmúrio dos rios, do cântico dos pássaros. Tomás de Aquino era um poeta-teólogo, acadêmico, compondo hinos litúrgicos profundos.

Francisco de Assis queria persuadir pela simplicidade das ações vistas pelos homens para arrastá-los a Deus. Tomás de Aquino desejava persuadir pelas palavras para levar milhares até o Criador.

Francisco de Assis pode ser comparado com um manso cordeirinho imerso na natureza. Tomás de Aquino, como foi relatado, foi comparado a um boi, cujos mugidos ecoaram pelos séculos afora.

Francisco de Assis era filho de um comerciante da classe média e não estava de acordo com a vida mercantil do pai, pois não amava a agitação do comércio. Seu desapego total às coisas do mundo não se adequava à busca de um lucro material. Tomás de Aquino era de família nobre e poderia ter todo o conforto que o mundo oferece, mas desprezou as glórias mundanas para se entregar inteiramente a seu mundo interior sem o apego a tudo que o luxo pode oferecer.

Ambos por caminhos diferentes e numa ótica diversa optaram pela pobreza evangélica. Francisco de Assis o homem menos mundano que andou pelo mundo viveu neste mundo como um pobre caminhante. Tomás de Aquino procurava a solidão como alguém que não fosse deste mundo para andar pelos caminhos do espírito nas regiões de profundas questões intelectuais.
Francisco de Assis pode ser chamado o trovador de Deus, mas, por certo, não admitiria o Deus dos trovadores. Tomás de Aquino não reconciliou Cristo com Aristóteles, mas sim reconciliou Aristóteles com Cristo.

Francisco de Assis é o santo da ecologia. 
Tomás de Aquino é o santo da filosofia.

Francisco de Assis mortificava tanto o seu corpo que mereceu ter em si os estigmas, ou seja, as chagas de Cristo. Tomás de Aquino preferia filosofar sobre o corpo, ensinando que o homem não é um homem sem o corpo, tal como o não é sem a alma.
Francisco de Assis tornou-se um santo eminentemente popular. Tomás de Aquino um santo mais venerado pelos intelectuais.

Quer Francisco de Assis, quer Tomás de Aquino deixam ambos uma mensagem vibrante para este final de milênio: a felicidade não se encontra fora de cada um, mas lá no íntimo do ser racional. Ambos convidam para esta viagem que muitos não gostam de fazer: entrar no âmago da própria consciência. Lá se descobre Deus, para, em seguida, como fizeram os citados personagens, se abrir para o próximo, para a natureza, para as conquistas da inteligência.

Ambos mostram que há caminhos diversos para se atingir o objetivo último do homem nesta busca, nem sempre bem direcionada, da tranqüilidade, da ordem e da paz.
Este reencontro com tão ilustres e sábias figuras por certo move a um repensar frutuoso no sentido daquele auto-controle tão necessário seja a quem for.

Como mostra Francisco de Assis não é preciso se apartar do mundo e das maravilhas que Deus espalhou por toda parte. Cumpre curtir a vida.

Como ensina a vida de Tomás de Aquino não se pode afastar das conquistas do espírito, da inteligência. Tomás, certamente, se vivesse hoje, estaria enfronhado nos progressos humanos. Nas suas reflexões procuraria o sentido, o significado da ciência e da técnica tão avançadas de hoje. Deixou, porém, ele princípios valiosos para que os homens do século atual façam tal análise com pertinência e sabedoria.

Uma aventura divina



A existência de Tomás de Aquino foi, sem dúvida, uma aventura divina.

Quando olhamos para o firmamento à noite, imenso veludo cravado de estrelas, percebemos que umas brilham mais do que outras. Tomás de Aquino no firmamento dos grandes homens é estrela de primeira grandeza. Entre os santos que o cristianismo apresenta, nenhum foi mais sábio.
Ao lado de uma cultura invejável e de uma inteligência admirável Tomás de Aquino deixou o exemplo de uma grande humildade. Honras e dignidades eclesiásticas lhe foram oferecidas, mas ele as recusou. Quis sempre viver na solidão de seu convento onde se refugiava quando não estava a dar aulas ou a pregar.

Tomás de Aquino revela que não basta um saber enciclopédico, mas este deve ser sólido, profundo, alimentado na reflexão contínua.

Na doutrina de Tomás de Aquino encanta não apenas a universalidade dos temas que abordou, dos quais tratou, mas a clareza de sua explanação é também digna de nota.

A obra monumental de Tomás de Aquino foi, sem dúvida, aSuma Teológica, a qual se pode comparar às majestosas catedrais do estilo gótico de seu tempo, elevando-se acima de todos os escritos deste gênero.

Tomás de Aquino ensina como uma vontade determinada, férrea, pode atingir os mais nobres objetivos. A concentração da inteligência nos estudos leva a resultados maravilhosos.
Num mundo no qual tudo arrasta o homem para fora de si mesmo, deixando-o entre as ondas revoltas da angústia e da agitação interior, Tomás de Aquino é um convite vivo a instantes de uma salutar entrega ao silêncio em busca daquela serenidade que felicita e engrandece.

Tudo que foi relatado dizendo respeito ao tomismo, mostra que se trata de um tomismo atual, perdurável e não um tomismo medieval. Isto mostra que há, de fato, em tudo que Tomás de Aquino escreveu uma tendência universalista.

Oferece, realmente, o conjunto de ensinamentos do grande filósofo de Aquino elementos valiosíssimos para pensar o mundo e o momento atual à luz das verdades perenes. Surgem, realmente, novos pensadores que sob a conduta do Doutor Angélico se consagram a estabelecer a ordem segundo a verdade.

É a verdade que sempre salva e liberta o ser racional, hoje, sobretudo necessitando de um senso crítico apurado. A juventude precisa deste amor à verdade para não se deixar levar pelas armadilhas do erro e da mentira.

O tomismo não quer em absoluto retornar à Idade Média. Trata-se, contudo, de salvar e de assimilar todas as riquezas oferecidas por Tomás de Aquino para valorizar tudo que há de positivo nos tempos modernos. É que o tomismo pretende usar da razão para separar o verdadeiro do falso. Pode purificar certas tendências modernas e integrar tudo que a verdadeira conquista do espírito humano conseguiu após Tomás de Aquino. De fato, o tomismo é uma filosofia essencialmente sintética e assimiladora.

O tomismo é uma sabedoria que nasce de um sistema magnificamente arquitetado por Tomás de Aquino, apta, portanto, para orientar as mentes, libertando-se do erro.

No momento em que se nota no mundo de hoje um surto religioso inegável, a presença de Tomás de Aquino é de fundamental importância. Os cristãos, sobretudo, se empenham em viver o que Jesus ensinou e procuram, sem falso moralismo, uma vida longe de lances desonestos que maculam e escravizam. O exemplo magnífico de Tomás de Aquino que, em plena juventude, venceu espetacularmente a tentação sexual, realmente, arrasta e inspira gestos semelhantes.

Com justiça ele foi denominado o Doutor Angélico. Tal elevação de uma existência singular se deveu à sua íntima união com Deus. Hoje grupos juvenis se formam e sem nenhum respeito humano se põem a cantar os louvores divinos e buscam uma perfeição de vida, motivo de fagueiras esperanças. Tudo que Tomás de Aquino realizou ele o consegui indo à fonte suprema do Bem. Neste aspecto há uma sintonia muito grande entre a mentalidade do Aquinate e esta onda religiosa hodierna.

A piedade de Tomás de Aquino era algo viril, pois o conduzia a ações verdadeiramente heróicas. É este o ideal que toma conta de centenas de jovens que não desejam se deixar levar pelas vagas dos vícios, mormente das drogas que matam e rematam tantas vezes a crueldade de espíritos perversos que se enriquecem com as desgraças alheias.

Tomás de Aquino constitui-se deste modo num apelo vibrante a que prossigam todos nesta caminhada vibrante da afirmação pessoal.

Pode-se, portanto, dizer que Tomás de Aquino se torna assim um notável concidadão dos tempos modernos.

Aos males da inteligência ele propõe o remédio do exercício da razão, capaz de desmascarar as insídias das manipulações dos donos do poder.

Aos desastres éticos e morais ele aponta a retidão da vontade firmada na proteção de Deus a levar para longe das servidões dos falsos prazeres.

Ao desânimo que, por vezes, se instaura em tantos corações ele propõe a experiência de Deus, fonte de toda paz e energia interior.

A uma ciência e a uma tecnologia materialistas ele contrapõe o retorno incondicional a Deus, cuja existência ele soube tão bem provar.

A este herói da ordem intelectual se deve acorrer para se buscar nas conquistas do espírito a força capaz de erguer um mundo que se deixou levar pelo endeusamento de falsos ídolos.

Em nossos dias quando a filosofia voltou a ser novamente prestigiada nos currículos até do segundo grau, o reencontro com Tomás de Aquino só poderá resultar numa maior pujança intelectual e cultural.

Por tudo que aqui foi escrito sobre Tomás de Aquino se pode concluir que ele é, de fato, o mais sábio dos santos e o mais santo dos sábios!


____________________________
NOTAS

1 Santo Tomás, Suma Teológica I, q.2, a. 3.

2 Idem, ibidem.

3 Joseph de Vries, Deus (Provas da existência de) in: W. Brugger, Dicionário de Filosofia. São Paulo, Herder, 1969, p. 131.

4 Santo Tomás, idem, ibidem.

5 Regis Jolivet, Tratado de Filosofia, vol. III, Metafísica, Rio de Janeiro, Agir, 1972, p. 387.

6 Apud Leonel Franca, Noções de História da Filosofia, Rio de Janeiro, Agir, 1967, p. 55.

7 Leão XIII, Aeterni Patris, Rio de Janeiro, Presença (Tema Atual no 43).

8 Odilão Moura in: Leão XIII, op. cit., p. 14.
9 G.K. Chesterton, S. Tomás de Aquino, Braga, Livraria Cruz, 1957, p. 255.
10 Idem, ibidem, p. 195.
11 Dino Staffa, Vitalidad del Tomismo, Salamanca, Imprensa Calatrava, 1963, p. 27.
12 Jean Ladrière, La situation actuelle de la philosophie et la pensée de Saint Thomas in: Benedetto d’Amore, Tommaso d’Aquino e il Centenario dell’enciclica “Aeterni Patris”, Roma, Società Internazionale Tommaso d’Aquino, 1979, p. 100.
13 Wolfgang Kluxen, L’originalité de Saint Thomas d’Aquin et le problème d’um thomisme contemporain in: Benedetto d’Amore, op.cit., p. 209.
14 João Paulo II in: L’Osservatore Romano, Vaticano, Ano XXI, no 43 (1091) 28.10.1990, p. 9.


* Professor no Seminário de Mariana – MG
BIBLIOGRAFIA
CAMPOS, Fernando Arruda. Tomismo Hoje, São Paulo, Loyola, 1989.
CARVALHO, José Geraldo Vidigal de, Temas Filosóficos, Ouro Preto, UFOP, 1982.
CHESTERTON, G.K. Santo Tomás de Aquino, Braga, Livraria Cruz, 1957.
GILSON, E. Tomás de Aquino in: História da Filosofia Cristã, Petrópolis, 1982.
HIRSCHBERGER, J. Tomás de Aquino in: História da Filosofia na Idade Média, São Paulo, Herder, 1966.
MATOS, Carlos Lopes (Cons) Santo Tomás, Vida e Obras in: OS PENSADORES, S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
PADOVANI, U. e CASTAGNOLA, L. Tomás de Aquino in: História da Filosofia,Melhoramentos, São Paulo, 1970.
REALE, G. e ANTISERI, D. Tomás de Aquino in: História da Filosofia, vol. I, São Paulo, Paulinas, 1990.
SERTILLANGES, A. D. Santo Tomás de Aquino, Alcan, Paris, 1925.
TOMÁS DE AQUINO, SUMMA THEOLOGIAE, 3. vols., Taurini-Romae, Marietti, 1950.

6 de jun. de 2014

São João XXIII e sua Devoção a Santa Teresa

O fascínio de João XXIII por Santa Teresa de Ávila






Ainda como Cardel, Angelo Roncalli gostava de fazer passeios a pé por Roma para visitar doentes e idosos levaram, o que lhe rendeu um apelido carinhoso: Johnnie Walker. Este era um dos elementos em comum que ele tinha com a santa andarilha por excelência,Teresa de Jesus, por quem sentia uma grande devoção e de quem admirou tanto o espírito de oração como seu apostolado renovador.

De fato, em uma das suas viagens à Espanha antes de ser papa, o então cardeal Roncalli visitou Ávila e Alba de Tormes, e isso lhe causou tal impacto, que recordou o fato diversas vezes ao longo do seu pontificado.

A personalidade simples de João XXIII gerou inúmeras histórias. O apelido de Johnnie Walker não parecia incomodá-lo, pois ele se manteve fiel a esse costume de sair do Vaticano para levar a cabo sua singular maneira de entender o apostolado – algo que, além isso, compartilhava com quem foi uma das suas referências espirituais, Santa Teresa de Jesus.

A devoção teresiana de Angelo Roncalli se nutria de duas fontes: sua admiração pela figura histórica, o espírito de oração e o ardor renovador que caracterizou a mística doutora; e a simplicidade e zelo missionário também de Santa Teresa de Lisieux.

De fato, se durante seus anos como núncio em Paris, ele aproveitou para conhecer pessoalmente o carmelo teresiano de Lisieux, como patriarca de Veneza e só quatro anos antes de ser eleito papa, o cardeal Roncalli aproveitou uma viagem à Espanha para visitar o carmelo de Alba de Tormes – onde se venera o túmulo da santa – e entrar na clausura carmelita do mosteiro da Encarnação, onde Teresa de Ávila passou a maior parte da sua vida e onde teve algumas das suas experiências místicas mais destacadas.

Assim, em 25 de julho de 1954, o patriarca de Veneza chegou a Alba de Torme, procedente de Santiago de Compostela, onde recebeu o então bispo de Salamanca, Dom Francisco Barbado.

O anfitrião lhe mostrou a catedral, a Casa de las Conchas e outros monumentos, e atendeu ao pedido do cardeal de visitar o carmelo onde se venerava o túmulo da santa.

Poucas horas depois, entraram no convento de Alba de Tormes, onde ele assinou o livro de visitas da sacristia com uma ideia teresiana que havia feito sua: “Santa Teresa por amor de Jesus e da Santa Igreja. Padecer ou morrer”.

Naquela mesma tarde, ele viajou a Ávila para visitar o mosteiro da Encarnação. Para a sua surpresa, o bispo da diocese, Dom Moro Briz, ainda que estivesse ausente, autorizou-o a entrar na clausura do carmelo, orar nos locais em que Teresa esteve e conhecer a parte do convento que era conservada exatamente como na época da santa.

As próprias carmelitas o guiavam: “Aqui foi onde Jesus lhe apareceu”, “Aqui ela viu o Ecce Homo”...

Na saída, Roncalli explicou a um dos seus acompanhantes (o historiador Ignacio Tellechea, autor do livro “Esteve entre nós”) o impacto que lhe havia causado o quarto pequeno, fechado e escuro no qual havia acontecido o luminoso episódio da transverberação.

Anos mais tarde, e já sendo papa, recordou ambas as visitas em quatro ocasiões, e inclusive, em 1962, concedeu um Ano Santo nas duas localidades, por ocasião do IV centenário teresiano.

De fato, tanto na carta de abertura do Ano Santo, datada de 16 de julho de 1962, como no seu discurso ao Capítulo Geral dos carmelitas descalços, em 29 de abril de 1961, João XXIII resumiu a vida da santa e a história da Ordem com as três chaves que ele mesmo aplicou para convocar o Concílio Vaticano II: gratidão a Deus pelo caminho percorrido; espírito de oração e a habitual amizade com o Doce Hóspede da Alma; e um zelo missionário, que é a chama que arde no coração de Jesus e não deixa de tocar todos os que podem e devem compreender o valor do mandato de Cristo, bem como o apelo do seu humilde vigário: “Ide e anunciai a todos os povos” – um mandato que, como se vê, não passa de moda.

(Artigo publicado originalmente por Alfa e Omega)

sources: Alfa y Omega
© Public Domain
11.04.2014 // IMPRIMIR

27 de abr. de 2014

Emaús: da decepção à esperança



Emaús: da decepção à esperança


Nesse mesmo dia – diz São Lucas -, dois discípulos caminhavam para uma aldeia, chamada Emaús, distante de Jerusalém sessenta estádios –cerca de doze quilômetros. Iam falando um com o outro sobre tudo o que se tinha passado . Aquilo que se tinha passado era, nada mais nada menos, a paixão e a morte de Jesus, a “derrota” estrondosa de Cristo às mãos dos seus inimigos, enquanto as multidões, que cinco dias antes, no domingo de Ramos, o haviam aclamado entusiasmadas, vociferavam com ódio: Crucifica-o! Crucifica-o!
Podemos imaginar, por isso, qual era o seu estado de ânimo. Perdidos, deprimidos, desnorteados, conversavam como quem não acaba de acreditar que tivesse sido possível aquele afundamento dos seus sonhos. Assim andavam quando Jesus aproximou-se e caminhava com eles; mas os olhos estavam-lhes como que vendados e não o reconheceram.
São Josemaría Escrivá oferece-nos uma descrição cálida da aparição de Jesus ressuscitado a esses discípulos: “Caminhavam aqueles dois discípulos – escreve – em direção a Emaús. Andavam a passo normal, como tantos outros que transitavam por aquelas paragens. E ali, com naturalidade, aparece-lhes Jesus e caminha com eles, numa conversa que diminui a fadiga. Imagino a cena, bem ao cair da tarde. Sopra uma brisa suave. Em redor, campos semeados de trigo já crescido, e as oliveiras velhas, com os ramos prateados à luz tíbia”. São palavras poéticas que nos ajudam a fazer meditação, sentindo-nos dentro da cena, participando dela “como mais um personagem”.i
Ouçamos, pois – enquanto os acompanhamos –, as primeiras palavras que o Senhor lhes dirige: De que vínheis falando pelo caminho, e por que estais tristes?. O diálogo que se travou é digno de ser meditado. Primeiro, como pessoas frustradas, os discípulos respondem de mau humor, num tom ríspido: Um deles, chamado Cléofas, respondeu-lhe: “És tu acaso o único forasteiro em Jerusalém que não sabe o que nela aconteceu nestes dias?”… É como se dissesse, meio admirado e meio irritado: “Todo o mundo sabe. Onde é que você vive? Só você está por fora?”
Que ironia! Dirigem-se rudemente a Jesus, lançando-lhe em rosto a sua ignorância a respeito da tragédia… do próprio Jesus! Tudo isso chegaria a ser cômico, se não fosse dramático. Mas nosso Senhor, como em todas as cenas da ressurreição, mostra-se especialmente afável e bem-humorado para com eles. Ousaria dizer que é até propositadamente divertido. Fazendo-se de ingênuo, pergunta-lhes “Que foi? Que houve?…” Assim quer ajudá-los a abrir o coração, como, aliás, Ele deseja fazer conosco sempre que nos vê desanimados ou tristes: “Eu estou aqui – diz-nos -. Fala comigo”.
E eles abriram-se mesmo. Despejaram o vinagre da sua decepção. Falaram ao caminhante desconhecido sobre um tal Jesus de Nazaré, profeta poderoso em obras e palavras diante de Deus e de todo o povo, comentando os acontecimentos trágicos da quinta e da sexta-feira santas, e contaram-lhe como tinha acabado pregado na Cruz. Depois, confessaram a sua tremenda frustração: Nós esperávamos que fosse ele quem havia de restaurar Israel, e agora, além de tudo isso, já é o terceiro dia que estas coisas aconteceram.
Um erro de Esperança
Esse era o mal que lhes corroía a alma: Nós esperávamos. Tinham colocado toda a sua esperança no Senhor. Tinham apostado nele. Por isso o haviam seguido, por isso tinham abandonado os seus planos pessoais, o aconchego do lar, tudo, jogando a vida numa só carta: a esperança de que Jesus fosse o poderoso Rei-Messias anunciado pelos Profetas, que triunfaria sobre todos os inimigos e se assentaria no trono do Reino de Israel, restabelecendo-o para sempre. Ninguém lhes tinha contado ainda que, em plena Paixão, Jesus declarara inequivocamente a Pilatos: O meu Reino não é deste mundo…
No entanto, eles, quase com certeza, já lhe tinham ouvido dizer: O Reino de Deus está dentro de vós… E também tinham escutado muitas das parábolas do Reino, que falavam, por meio de expressivos simbolismos, não de um reino terreno, político, mas de um Reino de graça, de paz e de amor que cresce dentro dos corações, nas famílias, nas sociedades, como o trigo que germina de noite e de dia; como o grão de mostarda que é pequenino e se torna árvore alta; como o fermento invisível que a mulher põe na massa de farinha e acaba fermentando-a toda… Ou como um Pai que perdoa o filho fugitivo, e um Pastor que procura a ovelha perdida e que é, ao mesmo tempo, o Rei-Deus que nos convida a participar do seu banquete de amor eterno…
Poderíamos definir com exatidão o engano dos discípulos de Emaús – igual ao de muitos atuais discípulos de Cristo – como um grande “erro de esperança”. Aí esteve a sua falha. Tinham esperança, sim, mas era uma “esperança equivocada”, não era a virtude cristã da esperança. Em conseqüência, estavam irremediavelmente fadados à decepção e ao fracasso, como quem dispara uma flecha para o alvo errado, ou dirige um veículo fora da estrada, que, quanto mais rápido vai, mais perto está do desastre.
Assim são muitas mulheres e muitos homens de hoje. O seu mal é a visão deturpada da esperança: esperam o que não devem, e esperam mal. Os exemplos são inúmeros: falsas esperanças amorosas, falsas esperanças profissionais, falsas esperanças de glória e triunfo, falsa confiança nas riquezas…
Onde está o erro? A resposta é simples. Espera mal quem espera qualquer coisa diferente da Vontade de Deus a seu respeito, qualquer coisa – por grande e empolgante que seja – que esteja fora dos planos que Deus preparou e deseja para ele. Então, acontece a essas pessoas o que Jesus dizia aos fariseus: Frustraram o desígnio de Deus a seu respeito (Lc 10,30). A vida deles tornou-se um plano divino traído, frustrado, que Deus não pode reconhecer como seu, e tem que lhes dizer: Não vos conheço (Mt 25,12).
É importante perceber que as pessoas não ficam frustradas “principalmente” por não terem alcançado os seus desejos, os seus sonhos. Na realidade, muitas das piores frustrações são as daqueles que alcançaram mesmo esses desejos e sonhos (“Já estou na faculdade, já tenho emprego, já me casei, já sou rico”), mas depois percebem que nada disso os preenche, não lhes traz a felicidade. Homens e mulheres ficam frustrados “principalmente” porque – sem sequer darem por isso – não atingem o ideal para o qual foram criadas por Deus, ou seja, por não terem sido fiéis à sua vocação de filhos de Deus, e por isso – desculpem a expressão rude – a vida delas, em vez de alcançar o desenvolvimento e maturidade de um filho que cresce, foi como um aborto. Fora do que Deus espera de nós, tudo é um triste aborto provocado… por nós!
Pensemos, por exemplo, nos casamentos fracassados. A maioria deles afundou-se porque marido e mulher “esperaram mal”. O que é que espera a maioria dos noivos, quando vão para o casamento? Sem dúvida, amar e ser felizes. Mas amar, como? Serem felizes, como? Muitos só pensam em “receber” do outro muito carinho, paciência, compreensão, todo o aconchego para se “sentirem bem” realizando os seus próprios gostos e caprichos, os seus prazeres, e até as suas manias. Poucos pensam em dar e dar-se generosamente para o bem do outro e dos filhos, em construir uma família com abnegação generosa e desprendimento alegre, felizes por fazerem felizes os demais. Ou seja, não pensam no verdadeiro amor, no autêntico amor-doação, no único que pode trazer a felicidade.
Por isso, quando chega a hora da verdade e aparecem as dificuldades inevitáveis – essas com as quais Deus conta para nos purificar e amadurecer –, não compreendem que essas dificuldades são apelos para se darem mais, para amarem mais, para dialogarem mais, e não para irritações, más caras, resmungos e gritos; que é a hora da compreensão, e não a da imposição; que é a hora de escutar com humildade, e não de “ter razão”…. Infelizmente, não entendem nada disso. E, então, tudo vai por água abaixo. Não foram ao casamento preparados para o verdadeiro amor, mas para “consumir” satisfações (como “consomem” os outros prazeres da vida). É natural que acabem dizendo, como os discípulos de Emaús: “Nós esperávamos outra coisa”…
É preciso abrir os olhos da alma, com a ajuda de Deus, e compreender que a vida não é uma laranja para chupar e cuspir, que os outros não são cana de açúcar para tirar o caldo e jogar fora o bagaço, que Deus não é um “seguro protetor de egoísmos”, e que os outros não são “bens desfrutáveis”. Viver e ser feliz é coisa infinitamente maior do que “usufruir”!
A virtude da Esperança
Qual é, então, a verdadeira esperança cristã? É a confiança firme, nascida da fé viva que nos diz que viveremos envoltos no amor de Deus aqui na terra – em todas as circunstâncias e vicissitudes de cada dia – e, depois, eternamente no Céu. Tudo o que conduz a isso é bom. Tudo o que afasta disso é mau. Tudo o que conduz a isso acaba em felicidade – já aqui na terra -, e tudo o que afasta disso acaba em tristeza, e até – Deus não o permita – pode acabar em tormento eterno.
É muito claro o que diz o Catecismo da Igreja Católica sobre a esperança: “A esperança é a virtude teologal pela qual desejamos como nossa felicidade o Reino dos Céus e a Vida Eterna, pondo a nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos não em nossas forças próprias, mas no socorro da graça do Espírito Santo… A virtude da esperança responde à aspiração de felicidade colocada por Deus no coração de todos os homens; assume as esperanças que inspiram as atividades dos homens; purifica-as para ordená-las ao Reino dos Céus; protege contra o desânimo; dá alento em todo o esmorecimento; dilata o coração na expectativa da bem-aventurança eterna. O impulso da esperança preserva do egoísmo e conduz à felicidade do amor” (nn. 1817 e 1818). São textos preciosos, que daria para meditar durante horas.
A grande Lição dos Discípulos de Emaús
Voltando para a cena dos discípulos de Emaús, vale a pena prestar atenção ao que Cristo lhes disse, quando terminaram o seu desabafo de desiludidos. Nosso Senhor começou a falar-lhes de modo claro, incisivo, sem rebuços, com palavras que tiveram o efeito de lancetar-lhes o tumor de ceticismo que lhes corroía o coração: Ó gente insensata e lenta de coração para acreditar em tudo o que anunciaram os profetas! Porventura não era necessário que o Cristo sofresse estas coisas e assim entrasse na sua glória?” E começando por Moisés, percorrendo todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava dito em todas as Escrituras”, ou seja, as inúmeras profecias que falavam da sua Paixão. Jesus desvendou-lhes, assim, com um jato de luz divina, o plano da Trindade para a salvação do mundo, uma salvação que havia de ser realizada pelo máximo ato de Amor imaginável: a entrega do Filho de Deus na Cruz para a redenção dos nossos pecados.
Foi na Cruz, com efeito, onde o Filho de Deus – Deus feito Homem, encarnado por nós – atingiu o limite máximo do Amor, e com esse amor ilimitado, envolveu, compensou, purificou e superou todos os nossos desamores, todos os nossos pecados. Como fruto deste seu sacrifício, derramou sobre nós a graça do Espírito Santo – o fogo do Amor divino em pessoa –, e abriu-nos de par em par as portas do Céu.
Quer dizer que o que Cléofas e o companheiro lamentavam como uma desgraça (a paixão e morte de Cristo), foi, na realidade, a maior maravilha de toda a história da humanidade, o maior bem do mundo, o maior motivo de alegria de todos os séculos! Insensatos! – disse-lhes Jesus. Sim, insensatos os que não vêem isso e vão atrás de sombras e aparências falsas!
Enquanto Jesus ia falando pelo caminho, os corações dos dois caminhantes foram mudando. Um calor novo os invadiu, uma faísca de esperança se acendeu neles. Aproximaram-se da aldeia para onde iam, e Jesus fez como se quisesse passar adiante. Mas eles forçaram-no a parar: “Fica conosco, já é tarde e o dia declina”..
É uma bela oração para nós fazermos, quando começarmos a sentir a proximidade de Jesus: “Fica conosco! Não nos deixes, queremos estar contigo, queremos ter-te como amigo, queremos abrir-te a alma. Fica!” E, além do mais, bem que percebemos que já se nos faz tarde, que a vida passa, que a vida acaba, sim, já é tarde e o dia declina. Olha, Senhor, que gastamos boa parte deste “dia”, que é a vida, entre falsas esperanças e verdadeiras frustrações. Precisamos de Ti. Por favor, fica, que só em Ti se acha a esperança…
Com Cristo, o coração arde
Então – continua a contar São Lucas –, entrou com eles, e aconteceu que, estando sentados à mesa, ele tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e serviu-lho. Então se lhes abriram os olhos e o reconheceram…, mas ele desapareceu. Diziam então um ao outro: “Não é verdade que o nosso coração ardia dentro de nós enquanto ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?”
Tudo, nessa belíssima cena dos discípulos de Emaús, é espelho e modelo para nós. Bem dizia São Josemaría Escrivá: “Caminho de Emaús, caminho da vida”… Quando nos entristecer a falta de sentido de tantas coisas, e sobretudo, quando nos acabrunharem as decepções que parecem amontoar-se e afogar a esperança, façamos como os discípulos de Emaús:
Primeiro, abramos a alma a Deus (às vezes, a melhor maneira de abri-la é fazer uma confissão muito sincera).
Depois, escutemos as suas palavras, meditemos a Sagrada Escritura – especialmente os Evangelhos – com calma, com carinho, deixando que as Palavras de Deus penetrem na alma como a chuva na terra. Elas nos mostrarão que o que nos parece ruim muitas vezes é bom, que a Cruz – que julgamos ser uma porta que se nos fecha e nos deixa num beco sem saída – na realidade é uma porta que se abre, para que entremos num mundo melhor, de mais amor, de mais bondade, de mais pureza, de mais virtude.
Em terceiro lugar, acolhamos Jesus em casa, na casa da nossa alma, recebendo-o sempre dignamente na Eucaristia, na Comunhão, que é a união com Deus mais íntima que a criatura humana pode ter nesta terra: Jesus em nós, Jesus alimento nosso, Jesus sangue do nosso sangue e vida da nossa vida!
E por fim, a alegria. O coração desanimado, que estiolava e murchava, agora arde dentro de nós, e inflama-nos com uma nova esperança. Vemos um novo sentido para a vida, iluminada pela fé e o amor de Cristo, e temos necessidade de correr ao encontro dos outros, para contagiá-los com a nossa esperança, como fizeram os discípulos de Emaús depois que Jesus os deixou.
Lição de fé, lição de amor, lição de esperança. 
Vêm a calhar palavras com que São Josemaria começava uma homilia sobre a esperança: “Há já bastantes anos, com a força de uma convicção que crescia de dia para dia, escrevi: Espera tudo de Jesus; tu nada tens, nada vales, nada podes. Ele agirá, se nele te abandonares. Passou o tempo, e essa minha convicção tornou-se ainda mais vigorosa, mais funda. Tenho visto, em muitas vidas, que a esperança em Deus acende maravilhosas fogueiras de amor, com um fogo que mantém palpitante o coração, sem desânimos, sem decaimentos, embora ao longo do caminho se sofra, e às vezes se sofra deveras”ii.
Isto foi o que aconteceu com os discípulos de Emaús. Com o coração inflamado pela esperança, desfizeram o caminho dos desertores, voltaram a reunir-se com os Apóstolos e as santas mulheres no Cenáculo e participaram da alegria que – no meio ainda de sombras e hesitações – começava a alastrar-se entre eles e que anunciava, mesmo que muitos ainda não o percebessem plenamente e estivessem ainda atingidos pelo temor, um futuro de esperança pelos séculos dos séculos, até ao fim do mundo: “O Senhor ressuscitou verdadeiramente!…” Esta é a grande verdade! A esperança cristã acabava de nascer com a ressurreição de Cristo, e já não morreria nunca mais.
(Adaptação de um capítulo do livro de F.Faus: Cristo, minha esperança)
São Josemaria Escrivá, Amigos de Deus, n. 313
2 Amigos de Deus, n. 205

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