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21 de mar. de 2011

Vida em Cristo Crucificado do Beato Angelo Paolo O.Carm

"O mistério da paixão, morte e ressurreição do Senhor é o mistério central da nossa fé e o eixo em volta do qual gira toda a história da salvação. A cruz é, ao mesmo tempo, pergunta e resposta, escuridão e luz, símbolo de morte e tortura, símbolo de vida para o crente. O mistério da cruz prolonga-se na nossa vida de uma forma particularmente intensa no mistério dos crucificados: as vítimas do pecado em todas suas formas, as vítimas do mal, da violência e da injustiça."





"O Carmelo teve ao longo dos séculos uma profunda e íntima devoção pela cruz. Basta recordar, entre muitos outros: S. João da Cruz, que evoca a morte do Pastorinho-amante, Cristo, “numa árvore onde abriu os seus belos braços” (P 10); Santa Teresa de Jesus que, chamando atrevidamente a cruz de “bem-vinda” (P 7), nos convidava a fixar os olhos no crucificado para que tudo “nos pareça pouco” (7M 4,8); João de S. Sansão e Santa Maria Madalena de’ Pazzi que descobriram que a cruz é a melhor atalaia para contemplar o céu; Francisco da Cruz, carmelita castelhano dos s. XVI-XVII que foi em peregrinação a Jerusalém, carregado com uma pesada cruz pesada de madeira; Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face, que se consome no desejo de ir para terras de missão para aí plantar a “cruz gloriosa” (Ms B, IX, 3rº); Edith Stein, que mergulha na profundidade insondável da Ciência da cruz; ou o Beato Tito Brandsma, pregando sobre uma gaveta sebenta, na Sexta-feira Santa de 1942 no campo de concentração de Amersfoort, tendo escrito, pouco antes, na prisão de Scheveningen, o seu célebre poema Perante um quadro de Jesus na minha cela, onde confessa: “a Cruz é a minha alegria, não a minha dor”. A esta lista seria necessário acrescentar, sem dúvida alguma, a figura do frade pobre Ângelo Paoli, também ele apaixonado pela cruz de Cristo.



O Beato Ângelo Paoli viveu esta devoção profundamente e difundiu‑a pastoralmente ao longo de toda a sua vida. Já entre os pastores das montanhas próximas da sua aldeia, quando, ainda jovem frade, por lá esteve convalescente ao longo de vários meses, difundira aquela devoção, convidando-os a erigir cruzes no alto das montanhas e pregando‑lhes com grande afeto. Mais tarde, pároco de Corniola, também propagou esta devoção, e, já em Roma, é muito célebre o facto de ter erguido várias cruzes em lugares emblemáticos da cidade, tais como o Monte Testaccio ou o Coliseu. Aproveitando a proximidade do nosso convento de S. Martinho aos Montes, o P. Ângelo visitava a Igreja da Santa Cruz de Jerusalém e, de regresso da mesma, detinha-se a cuidar dos doentes do hospital de S. João de Latrão, levando-lhes comida, socorrendo-os nas suas necessidades mais básicas e animando-os continuamente, chegando mesmo a distraí-los com teatros improvisados ou músicas. O P. Ângelo morreu, beijando devotamente crucifixo. A iconografia insistiu frequentemente neste ponto.



O Carmelo dos nossos dias encontra no testemunho do novo Beato uma esplêndida fonte de inspiração, e, mais ainda, um apelo provocador. A nossa vocação contemplativa faz-nos penetrar na espessura das noites escuras mais dolorosas e sangrentas da nossa regeneração, onde vislumbramos a presença misteriosa do Senhor da vida. Não só isto, mas o novo Beato também soube “descobrir” ao longo da sua vida novas formas de pobreza: pobrezas escondidas ou pobrezas ignoradas, perante as quais a sociedade do seu tempo mostrava pouca ou nenhuma sensibilidade. O P. Ângelo teve a sensibilidade suficiente para perceber o sofrimento das jovens que, por falta de dinheiro, vinham a desembocar numa vida celibatária praticamente sinónima de miséria; o sofrimento dos que abandonavam os hospitais, uns, convalescentes, outros, fisicamente recuperados, mas que, de qualquer forma, acabavam por cair na mendicidade; o sofrimento das famílias arruinadas em consequência das inundações do rio Tibre; o sofrimento dos que se curavam das suas doenças, mas que sofriam a solidão, a tristeza e o abandono. Da sua atenção a todos estes grupos constam exemplos maravilhosos na biografia do nosso Carmelita. O seu testemunho leva-nos pois a abrir os olhos do coração, a escutar os frémitos do nosso tempo e a responder generosa e solidariamente às novas formas de pobreza e de marginalização criadas pela nossa sociedade.


O P. Ângelo também viveu intensamente a sua vocação carmelita. De facto, foi uma vocação bem meditada e discernida, uma vez que entrou no convento só depois de previamente ter recebido a tonsura e de ter pensado noutras formas possíveis de vida religiosa. Segundo os seus biógrafos, poderia ter sido a devoção mariana a incliná-lo para o Carmelo, a Ordem de Maria.


Tal como corresponde à piedade carmelita daquele tempo, o P. Ângelo viveu com zelo a vida conventual e os sinais que serviam para expressar o amor à Ordem e à sua espiritualidade e tradições. Amante do seu hábito (sinal, para ele, de pobreza e não de distinção), cumpridor fiel da observância religiosa, apesar das suas múltiplas ocupações, obediente aos superiores, fraterno e próximo dos irmãos da comunidade… o P. Ângelo foi um carmelita exemplar, um homem que viu na sua vocação Carmelita, não um impedimento ou um fardo, mas antes um incentivo e uma fonte de inspiração para o seu trabalho social com os pobres.

É realmente comovedora a cena das últimas horas do P. Ângelo. Ele, agonizando, rodeado pelos irmãos da sua comunidade, perfeitamente consciente e assumindo a sua morte com um verdadeiro espírito de fé e de piedade… Lá fora, na pequena praça em frente do convento, comparecem os pobres, os mendigos, os andrajosos, os necessitados, os doentes… para dar o último adeus àquele que tinha sido para eles um verdadeiro pai nesta terra.


Que o Beato Ângelo Paoli continue a acompanhar-nos na nossa tarefa em prol dos mais necessitados. Que nós saibamos aprender dele e da sua atitude para com os mais pobres. Que a Nossa Mãe do Carmelo, Estrela do Mar, nos ilumine e guie na hora de levar adiante tão admirável repto.





Fernando Millán Romeral, O.Carm.
Prior Geral
19 de Março de 2010 - Solenidade de São José



 

Responsorio:
O vos omnes qui transitis per viam, attendite et videte:
(Oh vós todos que passais pela via, vinde e vede:)
* Si est dolor similis sicut dolor meus.
(* Se há dor parecida com a minha dor. )
V. Attendite, universi populi, et videte dolorem meum.
(V. Vinde, todas as pessoas, e vede a minha dor.)
* Si est dolor similis sicut dolor meus.
(* Se há dor parecida com a minha dor. )